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terça-feira, 28 de setembro de 2010

O Espanto nos Olhos do Macaco

No topo de uma árvore tão alta que a imaginação humana só alcança através de um sonho helicóptero, lá estava ele, comendo uma fruta e contemplando a vida de uma altura íntima, conhecida sua, outras vezes visitada: um habitat. Seus olhos já não seguem todos os barulhos que a selva produz, muitos deles, ele já conhece e sabe aonde vão dar. Uma combinação sonora aqui outra ali, uma coincidência de grilos inusitada, uma mosca em dueto com uma rã, fazem com que ele de vez em quando perscrute com um leve mexer de cabeça. Nada tão surpreendente assim, só um pequeno suspiro que esse galho e aquele podem trazer, mas não muito diferente de outro e outro e daquela ou dessa árvore. É tudo muito alto e quieto e morder a fruta é um prazer necessário e silvestre. Ele é ele comendo depois de procurar comida e ser-se é algo que não se questiona. Ele sente fome, ele procura comida, ele come. Há outros como ele, mas ele é alguma coisa dentro dele que é e sempre é como é. Os outros são inquestionáveis, são quentes, são rápidos, são peludos, são cheirosos, são conhecidos e andam perto dele, mas não são ele com sua fome e desejo de fruta na mão e na boca. Os outros comem fruta, ele come fruta. O sol está morrendo entre as nuvens e ele não se admira e nem acha isso bonito ou feio ou interessante. Ele olha para o horizonte porque ele come fruta no topo. De repente ele é o terror de ser ele. O susto e a incompreensão disparam seu tempo interior. Ele é a perplexidade de ser ele agora indo, corpo agarrado, já além do que parecia ser o cume. Ele é a insegurança e o pavor de ser ele. Em sua nuca algo pontiagudo o comprime e fura. Ele é a dor de ser ele, saltando muito a cima do que jamais quis: arrastado pelo céu, ele é a impotência de ser ele.

A morte chegou águia quando ele era ele.

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