Um texto de teatro precisa ser lido de dentro dele mesmo. Existe muita ansiedade por parte dos atores inexperientes quando vão ler uma peça. Muitos já saem imprimindo emoções e seus cacoetes pessoais antes de entrarem no universo que a peça pretende criar. Saber respeitar a pontuação antes de sair se esganiçando em emotividades e, principalmente, saber ler a obra de dentro, é pré-requisito básico. Para que a obra possa ser lida de dentro, o texto precisa ser bom, não é verdade? Ou seja, a peça precisa possuir um “dentro”. Este “dentro” é mais do que aquilo que é chamado de sub-texto, embora o contenha, é uma correlação dramática que possibilita que os personagens tenham ações interiores, sem precisarem ficar andando pra lá e pra cá ou pegando objetos e gesticulando. As coisas acontecem no interior dos personagens e é de lá que deve vir a leitura; procurando entender as ações que impulsionam os acontecimentos na mente e no coração simbólico daqueles que são representados. Não é ler em “branco”, sem nenhuma inflexão, é ler tentando ser aquele que fala: o personagem. Errando ou não, mas sempre agindo e nunca procurando entender ou interpretar a fala. O ator age, o ator é falado em verbo de ação.
Muitos atores encontram dificuldades para ler ou “entender” um texto teatral. E começam a culpar o texto, no sentido de o mesmo ser chamado de “difícil” ou “diferente”. Mas a verdade é que um texto que contém personagens, sempre será diferente e difícil, pois é uma proposta para que você deixe de ser você e “seja” outro. Estar dentro do texto ou do contexto é não saber ou entender o que está acontecendo, é fazer acontecer, compreendendo assim a ação causadora e não fazendo uma reflexão mental do que é feito. Para um ator, compreender é agir. Assim se descobre se uma peça de teatro é eficiente ou não, descobrindo se ela proporciona ação dramática para o ator, ou se ela é apenas literatura, portanto, material inadequado para o teatro.
Em nossa vida, pouco é o que vivemos a partir do interior, a partir da ação pura, aquela que engloba todas as ações, o chamado não-agir, o Tao. Um lugar menos emotivo e mais prático, mais singular, no qual o sopro de nosso ser pode ser mais venturoso e menos covarde, mais ativo e menos defendido atrás de formulações psicológicas.
Aqui um exemplo de uma jovem intérprete lidando com o processo de entrar e viver de dentro o que o autor da obra quis dizer:
http://www.youtube.com/watch?v=tOR8hyGAQAc&feature=related
3 comentários:
Muito interessante! Hoje me pergunto até que ponto realmente a emoções são importantes para o texto teatral e a peça de modo geral, será que não haveria espaço para o teatro suscitar outra coisa senão emoções?
É uma discussão interessante, Leonardo. Eu penso que o que cada vez mais se torna desgastado é o psicológico, ou seja, o drama que mostra uma trajetória emocional-psicológica dos personagens. Nesse sentido, acho que tudo já foi feito ou experimentado. Acho que a Tragédia agora (sempre) pode ser um caminho, no qual as emoções são mais essenciais, mais arquetípicas, e o trágico pode ser mais abrangente que o dramático. Eu tenho chamado minha peça de Tragédia Poética, porque em vez de fazer as rubricas (as indicações de ação), o ator diz para platéia o que faria se fizesse. Meu intuito é criar imagens, abrir o espaço poético, propor uma interativamente imaginativa. É difícil hoje encontrar o novíssimo, ou seja, uma atualização que fale ao coração do público de um jeito menos mofado , mais além da novidade ou do "moderno". Sigamos tentando.
Abraço
Se não existisse o Medo talvez as emoções pudessem ser substituídas, mas como tocar o espectador se não pelas emoções? As pessoas tem medo de observar e refletir aquilo em si mesmas, medo de analisar quais as emoções que um texto estabelece em seus corpos e entender o porque disso.
Quanto a leitura de "dentro" acredito que essa seja a única forma de uma comunicação real entre ator e espectador, o sentir e o analisar e talvez venha dai a dificuldade que alguns atores tem de representar determinados textos, visto que para isso precisarão do "dentro" que nem eles mesmos sabem como perceber.
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